Abaylard, e Heloyza viveraõ no duodecimoSeculo; merecendo neste a mais destinctaContemplaçaõ, assim pelos seus talentos,e Conhecimentos literarios, como pelas qualidadesexternas, de que a Natureza liberalmenteos tinha dotado, nenhuma couza poremconcorreo tanto para os fazer celebres, como asua Paixaõ desgraçada: Depois de huma longaserie de infortunios, se retirou cada humdelles a Mosteiros, aonde consagraraõ o restode seus dias a exercicios de Religiaõ, e Penitencia.
IV
Succedeu, que alguns annos depois dasua separaçaõ, huma Carta, em que Abaylardnarrava a hum de seus Amigos todas as suasdesgraças, chegou por cazualidade ás maõs deHeloyza, despertou esta narraçaõ toda a suaternura; e deu occaziaõ a esta famoza Carta,que pinta taõ vivamente os Combates daNatureza, e da Graça.
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EPISTOLA DE HELOYZA A ABAYLARD.
Neste retiro quieto,Onde em morna solidaõLevanta os olhos aos CeosCançada contemplaçaõ;No Lugar onde o SilencioRepouza profundamenteQue movimentos perturbaõMinh'alma com dõr vehemente!Porque razaõ se extraviaõFòra do sancto retiroMeus sentimentos profanosPorque motivo eu suspiro!2E porque meu coraçaõ,De Amor o fogo esquecido,Inda será devoradoJa a cinzas reduzido?Que! Amarei ind'agora!Eis a Carta qu'elle envia,He o nome de Abaylard,Que inda bejo entre agonia;Nome fatal e querido!Nunca mais proferireiC'os meus labios, a que os votos.Impoem do Silencio a lei:He para sempre encerradaTerna idea de AbaylarNo coraçaõ, que naõ possoC'o a do meu Deos separar.Que minha Maõ se suspenda,Tal nome naõ và traçar....Mas, oh Ceos, que tenho escripto!Va-o meu pranto apagar.3Debalde Heloiza aflictaRecorres ao pranto, á prece,Determina o coraçaõ,E sempre a maõ lhe obedece!Muros, que encerrais sombriosMais de mil votos ardentes;E que os ecchos repetis.De Suspiros penitentes;Rochedos, grutas de espinhos,Por toda aparte errissados,Penhas que o uzo amaciaDos joelhos lacerados:Altàres, aonde Virgens,Com hum fervor incessante,Vellaõ de noite, e de diaCom palidez no semblante:Imagens d'aquelles Sanctos,Que aos Ceos por vencer se aprazemTua vista, e meu silencioInsensivel me naõ fazem:4Sempre o Ceo em vaõ me chama,Quando em fervente Oraçaõ,Subjeita me a NaturezaMetade do Coraçaõ;E as preces, jejuns, e o prantoNaõ póde extinguir thé gora,Nem ao menos moderarO fogo que me devora.Apenas tremula abriTua Carta, ah meu Querido!Logo teu nome s'of'receA meus olhos, meu sentido;Eis que subito rebentaO sentimento magoadoDe minhas desgraças todas,Nome fa